COSMOLOGIAS EM CONFLITO: O SANEAMENTO DOBRASIL E OS PESCADORES DA LAGOA FEIA - RJCOSMOLOGIES IN CONFLICT: THE SANATATION OFBRAZIL AND THE FISHERMAN OF LAGOA FEIA – RJ
Resumo
No Brasil, as políticas higienistas consolidaram-se, em 1940, com a criação do Departamento Nacional de Obras de Saneamento DNOS. Desde então, este órgão passou a executar inúmeros empreendimentos sanitaristas, tais como a retificação de rios e córregos, a drenagem de meios alagadiços e a sistemática abertura de canais artificiais. A atuação do DNOS concentrou-se principalmente no Litoral Fluminense, onde se esperava sanear uma área de aproximadamente 17.000Km². Na Lagoa Feia, a maior lagoa de água doce do país, antes mesmo de 1955 mais de 2 mil alqueires geométricos foram saneados. O empreendimento de tais obras, no entanto, encontrou forte resistência nas populações haliêuticas. Desse modo, em fins da década de 1970, por duas vezes as máquinas do DNOS, que operavam na Lagoa Feia, foram paralisadas pelos pescadores de Ponta Grossa dos Fidalgos–um pequeno arraial às margens da Lagoa. Existe, pois, um desacordo entre as diferentes percepções e apropriações do ambiente lacustre: de um lado, os engenheiros sanitaristas, respaldados por um conhecimento politécnico, e confiantes numa ordem imanente; do outro, os pescadores, com seu conhecimento naturalístico e sua concepção da natureza como parte de uma ordem transcendente. Mais do que meras representações sobre o espaço, as representações apresentadas por Engenheiros Sanitaristas e os Pescadores da Lagoa refletem diferentes orientações cosmológicas, postas em contraste no encontro entre os grupos e em suas definições sobre as formas apropriadas de tratamento do espaço lacustre. O objetivo deste estudo é apresentar e discutir as concepções distintas que esses grupos possuem do espaço lagunar, bem como desenvolver uma reflexão sobre os conflitos daí oriundos.