O mundo-fronteira
DOI:
https://doi.org/10.21680/1983-2109.2022v29n60ID30865Palavras-chave:
Guerra, Soberania, Colonização, Carl Schmitt, Nomos da Terra, Zygmunt BaumanResumo
Paulo Arantes explora a imagem original de fronteira que nasce com a modernidade e reflete sobre seus desdobramentos na atualidade geopolítica. O ponto de partida é a tese do sociólogo polonês Zygmunt Bauman de que os atentados de 11 de setembro de 2001 teriam marcado o fim simbólico da “era do espaço” e inaugurado uma era de vulnerabilidade permanente que ele denomina “terra de fronteira global”. Arantes recupera a teoria schmittiana de “nomos da terra” para explicar a transformação em curso. Interessa-lhe sobretudo o poder de desmistificação do pensamento liberal moderno que a franqueza do jurista alemão reacionário oferece. Afinal, sua teoria da vinculação intrínseca entre ordenamento jurídico e enraizamento espacial permite reconhecer na descoberta do Novo Mundo e na experiência colonial a precondição da instauração do jus publicum eruropaeum, do reconhecimento mútuo de Estados soberanos europeus e da consequente racionalização e descriminalização da guerra próprios da constituição do capitalismo. Na contramão da euforia globalizante da ideologia contemporânea, a teoria de Schmitt revela como o núcleo orgânico do capitalismo e sua periferia colonial surgem juntos e devem terminar separados, pois o fosso entre ambas seria constitutivo. A segunda consequência extraída é de que se o fundamento do estado de direito na Europa é seu avesso no ultramar, esse processo também é coetâneo de um pensamento por linhas globais. É nesse contexto que Arantes procura refletir sobre a novidade identificada por Bauman e já intuída por Schmitt no pós-guerra com o surgimento de uma potência nacional fora da Europa e que passa a reivindicar autoridade sobre um espaço já não é mais nacional. Demarcando uma nova linha global denominada “hemisfério ocidental”, os EUA inaugurariam também um novo conceito de soberania que despreza a antiga noção de anexação territorial e desarticula a relação intrínseca entre direito, Estado e territorialidade – processo que remonta tanto ao esgotamento da sangrenta expansão na frontier estadunidense quanto à vitória bélica avassaladora da jovem nação americana no desfecho das guerras mundiais às portas da Era Atômica. Os atentados contra o World Trade Center e os desmandos da política externa do Governo Bush aparecem assim como apenas as manifestações mais recentes e vistosas desse novo paradigma histórico em que tudo tornou-se fronteira e cuja marca é a generalização do estado de sítio. (Resenha por Artur Renzo)
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